AVISO: A série “Linha de Mundo” está temporariamente suspensa por motivos de força maior. Ela retornará quando possível, mas não há previsões concretas no momento. Peço desculpas pelo inconveniente, e aproveito para compartilhar um conto que escrevi, para vocês passarem o tempo até o retorno de Renato, seus amigos, inimigos, e pessoas de intenções duvidosas…

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PARAÍSO

por Fernando H. F. Sacchetto – 2004

  

 O cão rolava sobre os corpos, no meio da carne, satisfeito. Aquela era a felicidade absoluta. O chão ao seu redor era coberto de carne; alguns cadáveres quase inteiros, alguns ossos recobertos de carne, e pedaços soltos no chão fresco também. Ele mordia um naco de pernil e saboreava-o, abanando sua cauda. A carne não esfriava nem apodrecia, e o sol não incomodava também; o céu era sempre encoberto. O gozo total e irrestrito. O cão procurava dividir sua alegria indescritível com seus companheiros, que como ele também pulavam, brincavam, e principalmente comiam. Ele e um outro cão rodeavam um ao outro, apressadamente, com pedaços de carne na boca, em êxtase absoluto; não havia com o que se preocupar, pois Eles não estavam lá. Aliás, o cão nem se lembrava da existência destas terríveis criaturas; era como se Eles nunca houvessem existido.

Mas existiam, e a felicidade estava fadada a acabar, como sempre. Pois, ao olhar nos olhos de seu companheiro, a leveza e alegria do cão se esvaíam; pois ele via aqueles olhos terríveis, carregados de fúria e maldade, e ameaçavam-no junto com o restante da cabeça e do corpo assustador, as grandes orelhas redondas, formando a silhueta negra e assustadora, coroada pelos raios cruéis do sol. À sua frente, estava um dos Demônios, e a carne havia desaparecido; em sua boca, apenas o gosto da fome, e no ar, o cheiro da morte. Continue lendo